Walmor, Fernando, Arnaldo, Rodrigo, Almeidossauro e Flávio: alta concentração de talento por metro quadrado de palco. Foto de Maringas Maciel.
Ontem eu convoquei meus guarda-costas, saí das catacumbas e fui ao TUC (que aliás, também fica em um subterrâneo). Lá, dois grandes espetáculos esperavam minhas vistas tão fatigadas. Primeiro. O show dos Eles Mesmos. Vou tentar resumir a experiência.
A primeira sensação é de que não é possível sair tanto som de apenas três caras. A banda mescla música mexicana, punk, rock-a-billy e mais as coisas que eles extraem lá da cabeça deles mesmo (especialmente estas). O vocalista Fernando Gouvêa tem um vozeirão daqueles do tempo em que se cantava sem microfone (Vicente Celestino, Francisco Alves). E não economiza voz. E não sonega sentimento. Além disso, como todo guitarrista de power trio, tem que desdobrar em um halterofilismo instrumental para manter a casa de pé. O baixista dos Eles Mesmos é um caso à parte. Valter Ferraz alterna e mistura todas as técnicas em um instrumento sem trastes (segundo ele mesmo, o único traste daquele baixo é quem o toca, rererer). O baterista Vinícius Marçal parece ligado na tomada, é só a banda fazer clic! que ele sai detonando sem nem ao menos desmanchar o penteado (opa, o cara tem cabelo raspado, mas vale a imagem).
Esperando o segundo tempo, fiquei a matutar o que nos aguardava, já que no palco se reuniriam nada mais nada menos que uma mistura do sempre chique Rodrigo Barros, voando baixo, o Walmor Góes, indiscritível guitarrista e o vocal do sempre surpreendente Arnaldo Machado. O nome da tropa? Paz de Usinas.
Pois não é que os caras tiveram a ousadia de tocar sobre uma complicada base eletrônica pré-gravada? Correndo este risco e enfrentando a inexorável exatidão das batidas eletrônicas, debulharam uma série de canções (dá pra chamar assim?) nascidas da extrema invenção, com letras de uma poesia lancinantemente emocionante e uma execução muito além da burocracia.
O Arnaldo Machado tem uma presença de palco que impressiona. Aliás, qual será o segredo de tamanho preparo físico? Tai-chi-chuan? Chá de losna? O cara é cantor, ator, dançarino, tudo na mesma cena. É a palavra e o gesto in concert. O Walmor, como sempre, esmerilhou. O Rodrigo, que valeria só pela presença, charme e elegância, mostrou que não era apenas um baixista improvisado no começo da sua carreira, enfrentando ali, ao vivo, uma série de difíceis desafios harmônicos.
Legal saber que tem gente na cidade disposta arriscar as reputações (e as correspondentes famas de mau) para enfrentar com tamanha coragem o desconhecido. Ah , não dá para esquecer que em um dos mais impressionantes momentos do espetáculo, o Paz de Usinas contou com o auxílio luxuoso nos vocais do incrível Almeidossauro, do visceral Flávio Jacobsen e do Fernando Gouvea, the voice.
Na sequência, conforme o programa, eles cantariam The Clash acústico. Mas acho que não deu tempo. Mas, tudo bem, quem precisa disso. Ora, o The Clash... o The Clash que se... Espero, rezo e torço para que o trabalho destes dois trios continue. E que façam muitos shows. Aí até eu, que sou eu, vou acabar saindo da tumba.
(Roberto Prado)
3 comentários:
Quase melhor que vê-lo em pessoa no catacúmbico show de sábado no TUC é presenciar sua nova ressurreição aqui, em pleno domingo de páscoa -- longa vida a este amplo espectro!
que delícia de texto Beco.
bjins
Doris
Ivan, eu ando em fase espectral, mas logo ampliarei. Grande abraço, poeta.
Dóris, beijins pra você também. Legal que você veio, viu e gostou !
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