Na verdade não é frescura aquela dito de que poeta é "antena da raça" e coisa e tal. Acontece, mesmo. Porém, desgraçadamente, sem que o desgraçado do poeta tenha o mínimo controle do processo, como bem observou Sócrates, o craque dos filósofos, em uma de suas sovas bem dadas.
Entre estes receptores de mensagens futuras, a maioria não vai além de bombril na antena de TV - e já está mil de bom. Conseguindo isso, o sujeito já tem direito a virar cambota de felicidade. Outros porém passam da conta e, destes, destaco o meu amigo Sérgio Viralobos, em cujas obras venho percebendo, em décadas de amorosa observação, uma série de legítimas profecias. Não sei por que e nem de onde, mas em seus versos existem diversas antecipações de fatos, acontecimentos, fenômenos, tendências.
Para mostrar a vocês tudo que vi, precisaria escrever um livro sobre o assunto (um tijolaço, inclusive), coisa que só poderei fazer após profetizar as seis dezenas da loto ou depois de morto - com a ajuda de um bom médium. Mas, o que os tempos permitirem, vou postando por aqui. Uma dessas, que destaco apenas para fazer eco aos noticiosos, foi profecia escrita em um tempo que efeito estufa era conhecido apenas pelos especialistas em amadurar banana. O poema a seguir é de Sérgio Viralobos, com a luxuosa parceria de Thadeu Wojciechowski e Marcos Prado.
INCONSISTÊNCIA
Dante Alighieri
Um temporal desaba sobre a garoa fina
A Terra vira aquela água
Tudo se desmilingüindo
O mar, entre os rios, afluindo
A Torre de Pisa escorrega sobre a Capela Sistina
Um alpinista se afoga no Aconcágua
Por baixo do Canal da Mancha, escafandristas não vêem a luz do fim do túnel
Toda a engenharia do Japão em vão: maremoto, não terremoto
A Estátua da Liberdade bóia no Planeta dos Macacos
No Rio de Janeiro, nivelados por baixo flats e barracos
Cumpre-se a profecia do Anjo Exterminador de Buñuel
Vista assim do alto, a Terra azul fica feia na foto
(Sérgio Viralobos, Antonio Thadeu Wojciechowski e Marcos Prado)