sábado, dezembro 09, 2006

não acordei esta manhã porque não dormi

Tem coisa boa rolando na cidade. Confira abaixo e para ver os horários entre no site da Fundação.


Vai ter música, poesia, teatro, vídeo, cinema, performance, cartazes. Para sentir como vai ser, tome essa:

as mil e uma faces do desespero


não acordei esta manhã porque não dormi

ontem sorumbático, insone agora

com o mesmo olhar que te viu indo embora


quando é que você vai vir

e ver quem te viu e quer te ver?


só vejo no espelho angústia, depressão, melancolia

solidão, mágoa, saudade, desgosto

quando as madrugadas deixarão de ser noite e dia?


E mais esse:


se o teu amigo diz que entende

o que você está escrevendo

peça a ele um documento

mas antes registre a patente

se um inimigo diz que entende

o que não leu do que você está escrevendo

meta fogo em tudo que é documento

mate e descarregue na patente


se sentir, porém, que ninguém entende

o que você está escrevendo

jogue tudo que fez na patente


mas se sentir que você mesmo não entende

aquilo que está escrevendo

mergulhe, feliz, pela patente

(Marcos Prado)


segunda-feira, dezembro 04, 2006

Semana Marcos Prado: o andamento da parada


Lançamento de Os catalépticos. Ao fundo, o grande Adriano Sátiro.

Aos beijos, aos chutes, aos poucos, aos montes, Marcos Prado amava Curitiba e Curitiba amava Marcos Prado, cidadão que tinha uma presença capaz de fazê-la menos triste, menos cinza, menos pobre, menos jacu. Agora, passados 10 anos da sua morte, a rapaziada da cidade resolveu dedicar uma semana de dezembro (de 9 a 15 - data do aniversário do poeta) para colocar o bloco do Marcos Prado na rua. Saiba direitinho sobre os eventos clicando AQUI e indo a um belíssimo blog especialmente criado para a ocasião. Aproveito para postar três poemas e algumas fotos do Marcos.


Marcos, de chapéu, pressente a presença do fotógrafo no botecão. À mesa, Léia Leite observa.

todo dia encontro um artista novo
eu escrevo, eu pinto, eu desenho, eu canto
mas todos têm aquela cara de ovo
trato-os humildemente mas com espanto
isso não está escrito na cara deles
não vejo em nenhum o ar de sua graça
nem o trato nobre ou o ímpeto reles
raro o dono da própria desgraça

tenho por eles, porém, um amor triste
um amorzinho vagabundo, menos que inho
que de tão diáfano não sei como resiste
um dia pego um deles pelo colarinho
estrangulo no balcão aos gritos: despiste
não fique roxo, não obre, isso é um carinho

(Marcos Prado)

Marcos (à direita) observa Beijo AA Força detonando.

a mentira é a melhor amiga das artes
nela, gelatinosa, as glosas seculares
minúcias de paisagens inexistentes
um coração onde cabe um milhão diferentes

dondoca de agora, amanhã de coturno
segue sempre os passos de um antigo perjuro
a arte imita a arte que imita tudo
e é profunda, é verdade, bem no fundo

mas somos piores que os pintores de florença
ridículos comparados aos poetas de provença
michelângelo cagaria em cima de nossas estátuas
beethoven se limparia com as nossas pautas

que é a nossa dança diante de um delírio índio?
que é um soco nosso perto de um clay vindo?
por que, se finda é a arte, continuar mentindo?
repetir o que se repetiu de novo se repetindo?

(Marcos Prado)


O sofá é o melhor amigo do homem.

não há nenhum lugar melhor que o deserto para as idéias
ponha-se o nada sobre ou sob o absoluto e tudo será areia
o destino traçado e a rota escolhida do pensamento não calçam as mesmas pegadas
quando um homem pensa sozinho pensa por todos
não há liberdade maior do que estar sozinho no deserto nem sofrimento maior também
as idéias são como fragmentos de areia que se espalham e só
se juntam com exuberância quando
como dunas
cada dia num lugar diferente
quanto ao céu
ele não existe neste deserto por enquanto
onde ele está ninguém que caminha pelo deserto tem a mínima idéia

(Marcos Prado)