sábado, setembro 12, 2009

A hora e a vez da chibaba


Diversos figurões da república pararam de enrolar e hoje se declaram favoráveis à liberação (ou como eles preferem: descriminalização) da maconha.
Mesmo não sendo gourmet da tal planta, abstraio a dor de concordar com políticos e lhes dou razão. Proibir mato é o fim da picada.
Pois bem. Só semana passada apareceram o muito louco ex-presidente FHC (aliás, curiosamente, seu nome é quase THC, o mesmo que designa o princípio ativo da chibaba - tetrahidocanabinol), o cabeça-feita ex-ministro da justiça, Márcio Tomaz Bastos e o fissurado ministro do meio ambiente, Carlos Minc dizendo que, por eles, o povão poderia fumar despreocupadamente a sua folha de chuchu com pachioli na varanda.
Mas, na verdade, não é de filigranas jurídicas e polêmicas bestas que eu quero falar. É que lembrei da obra-prima que uns amigos meus escreveram, musicaram e ainda devem cantar por aí. Coisas assim precisam ser acesas para não virar fumaça.
Não lembro o título da bagaça, no original que eu tenho está faltando este pedaço. Talvez tenham usado para enrolar um. Vai saber.
PS.: Opa! O Trindade, lá do Reino Unido, já me lembrou do título da bagaça.


Caterva maldita


eu sou chegado numa maconha

eu gosto mesmo é de um bagulho bom

minha cabeça fica bambalhona

eu fumo puro e com manjericão


lá na jamaica chamam de ganja

dançam fumando e dizendo jah

rastafaris cabeças de nego

vou dando bola e dizendo oba


lá no pernambuco tem o cabrobró

a tal sensemilla vem do cafundó

rabo de raposa é muito mió


um troço louco lá do marrocos

vem em bolinha e tem que dechavar

baixaram todos os santos da bahia

quando a liamba começou rodar


ai que saudade eu tenho da tailândia

que veio em lata no solano star

índia, somália, trinidad, polônia

acho que fumo em qualquer lugar


lá no pernambuco tem o cabrobró

a tal sensemilla vem do cafundó

rabo de raposa é muito mió


(Rodrigo Barros, Beto Trindade, Thadeu Wojciechowski e Walmor Góes)


sexta-feira, setembro 11, 2009

A culpa no cartório


O remorso, pesadamente,

entrou no auditório.

Pediu a palavra,

abriu um dicionário.


Mas, como culpa puxa palavra,

que chupa outra do estoque,

sob apoio ruidoso da claque,

negou qualquer aparte.


Reclamando da sorte,

sacou do bolso do colete

a lista telefônica

de Nova Iorque.


(Roberto Prado)

quarta-feira, setembro 09, 2009

Sob a lupa do lupo




Sob o impacto dos últimos acontecimentos, lembrei deste poema feito por um trio da pesada e que depois foi magistralmente musicado pelo Beto Trindade. Vejam só:



uma enorme pedra
rolou sobre nossa casa
ela era de palha
como num conto de fada

moído cada utensílio
restou juntar os trapos
contar o que sobrou de filho
e chorar pelos barracos


(Marcos Prado, Antonio Thadeu Wojciechowski e Rodrigo Barros Homem Del Rei)

terça-feira, setembro 08, 2009

Três dedos de prosa




Neste mundo, o que é bom a gente tem que garimpar, meter a unha e não deixar escapar. Aqui vão textos escolhidos a dedo de três escritores de mão cheia. O Mário Bortolotto está em São Paulo, a Léia Leite no Rio de Janeiro e o Luiz Antônio Fidalgo eu não sei (onde você está, Fidalgo?)



1.

Trecho de Soda Pop, de Mário Bortolotto


Ninguém anda com ele e o cara detesta ficar sozinho. Deus, esse cara lê Olavo Bilac em voz alta e faz performances sob a luz do poste. Deus, eu ando aplaudindo meu único amigo. Deus, acho que eu sou menos que um escriturário, estou me sentindo menos que um escriturário. Ando falando com uma lata de biscoitos ando bebendo muito pra achar engraçado o lero com a lata de biscoitos. Deus, os biscoitos são tão apetitosos, eu choro quando penso em comê-los. Deus, eu não sei mais nenhuma oração mas eu rezo muito. Olha, eu vou embora vou enforcar a estátua do Aleijadinho vou arquitetar um plano de conseqüências terríveis para os mineiros cantores só vou livrar a cara dos que já morreram. Só bêbado tem saco pra ler o que escrevo. Deus, eu procurei uma clínica psiquiátrica e minha irmã estava na recepção me sorrindo e pedindo dados pessoais. Deus, eu preciso me desintoxicar eu toco a campainha e ela nunca atende eu vou na casa dela e ela deixa bilhetes com a mãe. As garçonetes não anotam meu pedido. Os mendigos não me pedem esmola. Até a acne está ameaçando me abandonar. Deus, você sabe como fazer as coisas.


2.

Conto de Dalton Fêmea, de Léia Leite


De uma hora pra outra, o rei da batucada.

Para ele o novo Francisco Alves.

Batucava nas panelas, bacias, baldes, tudo, até a tampa da privada, credo, ele chamava de surdo.

Sorte que sem cigarro e copo ele não fica. Com copo e cigarro, nada de samba batucado, porque começava a cantar. Um hipopótamo dando o último suspiro.

Que de dormir os esfomeadinhos gêmeos?

Agora ele, dou graças a Deus, um silêncio de morte.

É hoje.

Ele não vivia cantando que era para mulata sapatear no seu caixão?



3.

Aniversário, conto de Luiz Antônio Fidalgo


Pronto! Agora ele já tinha dez anos de idade. Já podia brincar com o grupo dos primos mais velhos, como sempre sonhara. – Seja bem-vindo, primo, disseram, colocando-lhe uma venda nos olhos e prevenindo de que só tirasse a tal venda, após ter contado até cem. Então, o levaram assim, cego, pra algum canto em alguma parte daquela casa enorme. – Noventa e dois... ele foi contando ... noventa e sete... enquanto o som da voz dos primos sumia por completo... cem! - Tirou a venda dos olhos. Surpresa! Tudo continuou escuro. Ele ficou ali, aguardando o que viria a seguir. Viu então, um pequeno ponto luminoso que foi crescendo, crescendo e iluminando todo o ambiente. Então ele pôde ver o que era: – Fogo, gritou, e percebeu que nas paredes da peça onde estava não havia interruptores de luz, portas ou janelas.