segunda-feira, fevereiro 20, 2006

Um antiensaio do aniquilamento


O cara da foto acima é o Marcos Prado posando para o livro Dois mais dois são três em um, parceria dele com o grande Sérgio Viralobos. Uma preciosidade na idéia, no texto, na concepção gráfica, foi o marco inicial de uma nova forma de ler, de sentir, de praticar e de se editar poesia. Poemas em parceria. Índice comentado. Epígrafes que complementavam. Tudo pensado nos mínimos detalhes. Fez revolução, mexeu com as cabeças e pôs as pernas para funcionar. A rapaziada em volta sentiu que o "faça você mesmo" não precisava e não devia significar indigência.

Onde eu quero chegar? Simples. Esse livro, que tanto sucesso fez, hoje é uma raridade. Conhecido mais por ouvir falar, sentido pela influência em outras obras, virou lenda. Quem tem, esconde para não roubarem. Marcos Prado ganhou recentemente uma edição primorosa, o Ultralyrics, pela Travessa dos Editores, que tem até CD encartado. Mas outro grande livro da mesma dupla ainda está inédito: O livro póstumo de marcos prado e sérgio viralobos.

E isso me faz lembrar de obras misteriosas, como a do título matador Um antiensaio do aniquilamento. Quem me passou um exemplar, entusiasmado, foi o César Bond, em algum dia do meio da década de setenta. Eu e o Marcos lemos e concordamos: o cara era forte. Mas, como bons meninos, devolvemos o exemplar ao Cesinha. Pronto. Nunca mais conseguimos botar a mão no livrinho. Sobrou apenas o que ficou na memória. Muitos amigos duvidavam da sua existência e um chegou a dizer que desconfiava ser um heterônimo nosso.

Mas eu sei que o autor era do interior de Minas Gerais, seu nome era Eduardo Alcântara e na época (quase 30 anos atrás) já não era nenhum jovenzinho. Ele existe (ou existiu) sim, senhores, e espero que algum mineiro bem informado diga onde encontrar Um antiensaio do aniquilamento e outras bossas do mesmo poeta.

Enquanto isso, sobra o que me ficou na memória. Pois ela insiste em teimar que caras assim não merecem ser esquecidos:

Anticredo

Creio na sombra que me isola,
creio na inútil mansidão
que rumina o passado; e creio
nos erros digeridos;
na assimilação anticonfessada
de emoções que frutificam
sem Ti.

Creio na fuga do sol
e na ausência da flor.

Creio no prematuro, o inacabado;
na volúpia do tempo
e na fortuna do espaço,
que afastam os germes;
creio no Id, no Ed, e no Supered
que me obrigam a crer
no sonho, na angústia e o antiímago.
Creio em Ti
Como sombra que afaga tanto Nada
para que a luz não se extinga entre meus dedos
de esqueleto sem pés e sem história.
Amém. Ou talvez não.

Eduardo Alcântara, de algum lugar das Minas Gerais.

4 comentários:

Ivan disse...

Beco:

no momento estou num hiato de postagens, mas se eu fosse postar hoje seria um poema assim:

Que importa o blog do Thadeu, do Solda ou do Bortolotto:

o que eu leio é o Beco.

***

demorei, mas linkei, e pra quem me incomodar por não postar, vou remeter pra cá: mande chumbo!

Roberto Prado disse...

O que eu vejo é o beco é muito legal. Viva o Bandeira! Cara, você acabou me acendendo a idéia de colocar umas coisas dele por aqui.

E é meio pra já: aqui vai o poema que o Ivan absorveu e devolveu de prima:

Que importa a paisagem, a Glória, a baía, a linha do horizonte?
- O que eu vejo é o beco.

(Manuel Bandeira)

Ligia K disse...

Beco, vc já tentou alguns sebos virtuais? Vou ver se descubro algo mais. Beijos.

Roberto Prado disse...

Legal, Lígia. Só lembro que o Eduardo Alcântara era de MG. E de alguns poemas, é claro. Grande beiho e gracias, muchacha!