O mais barbudo à direita é o meu grande amigo João Otávio Malheiros que, há quase 30 anos, tomou a sábia decisão de ir para um lugar ensolarado, à beira mar e bem longe. Fora a saudade minha e dos muitos outros curitibanos que lhe prezam a amizade, temos de concordar que ele estava coberto de razão (apesar de manter sua maluquice bem além do que a lei permite). Lá na ilha de São Luís do Maranhão, entre outras coisas, fundou uma ONG, a Amavida, que faz um trabalho muito bacana e pela qual realiza inenarráveis andanças pelos caminhos mais esquisitos, estreitos e escamosos do roçado do bom Deus (obrigado, Plínio Marcos). Numa dessas viagens foi um dos coordenadores de um encontro da ONU com a singela denominação de Sixth Session of the COP of the United Nations Convention to Combat Desertification. Onde era? Na Cuba de Fidel, com praia, sol e... bem longe (a foto é desse encontro, que eu localizei pelo São Google). Pois bem. Esses dias o meu filho Rodrigo deu um jeito de consertar umas coisas misteriosas no meu computador e eu, finalmente, consegui acessar o inacessível: os poemas que o João Otávio havia me mandado há uma pá de tempo. Alegria, alegria. Vejam aí embaixo algumas pérolas deste curitibano de Londrina que virou ludovicense (morador de São Luís, anarfas). Seja bem-vindo, João, mais um com defeito de fabricação.
Meus amigos gays depois do pôr-do-sol
Eles morrem de amores
Eles sofrem sempre horrores
Eles tremem cedo de medo
Não sabem guardar um segredo
Eles sonham acordados
E choram abafado no escuro
Eles às vezes cortam os pulsos
E riem às vezes a noite inteira
É quando dançam nas pedras
E atiram beijos pra lua
Não fingem então os sempre farsantes
As cores com que se maquiam
Guerra moderna
corre
abaixa
é natasha
ela morre
agorinha
na minha tv
as pessoas na ponte
com alvos no peito
estão tão prontas no prompt
já mortas de medo
mas ainda querem morrer
ao vivo na minha tv
Fila imensa
nunca
tanta
nuca.
O amigo morreu é findo
o enterro
o morto
foi lindo
foi rindo
eu berro
e bebo.
Locações para filmar o vento
Ilha, Beira-Mar
um palito de fósforo riscado
na calçada
ao meio fio
o palito mascado
jogado no chão
folhas secas
é tarde
e o vento chega com a noite
misturando os restos da cidade.
Aconteceu na beira do rio
É raso
E não tem pedras
Garantias-me antes da travessia.
Acreditei em ti
Mentias
E a água estava fria.
Lendo o jornal burguês
O New York Times não
mente jamais!
(mas pode mesmo a verdade
toda
caber dentro dos nossos jornais?)
O Sunday Times não
erra jamais
(vem todo o acerto do mundo
impresso em preto
nos nossos jornais).
Por isso o New York e o Sunday
não trazem a cotação
da bolsa de Maputo: eles não mentem.
Só a verdade pode manter o giro dos nossos capitais.
É inútil leitor, tu te iludes
Se procuras mentiras em nossos jornais.
(Poemas de João Otávio Malheiros)
Um comentário:
Grande cara, Beco. Viva o Rodriguinho.
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