terça-feira, março 27, 2007
Genialidades expostas
Solda e Rettamozzo, sozinhos, já são um bando de talentos. Imagine agora um evento que une estas criaturas plurais, múltiplas e, ao mesmo tempo, donos de assombrosa coerência ética e estética, que ultrapassa as décadas sem perder a surpreendente pegada. Pois saiba que esse encontro além da imaginação vai acontecer mesmo, a partir do dia primeiro, no Beto Batata. Anote. A gente se encontra por lá.
sexta-feira, março 02, 2007
Uma dupla de matar a mãe do guarda
É fato: Marcos Prado e Edson de Vulcanis escreveram juntos alguns dos mais belos poemas do orbe oval que os meus pés tocam. Para você ver e comprovar, selecionei algumas gemas da dupla, pura delícia, para deleite das boas almas.
ação entre amigos
vamos à churrascada de empalamento do padre estuprador, meu amor
vamos ao coquetel de linchamento do rubem fonseca, meu amor
eu já matei o escritor, matei inês
antes que talhasse o sangue do freguês
bercinho boiando no rio grande do sul
o farofeiro feio brilhava à beira de um luau
ouvindo solos de clarineta de seu pai
atocaiando jacarés e fazendo onda no mar de merda
o bêbado saldável
quando eu morri
meu pai tinha três anos
o saldo da minha alma está em retalhos
e o meu corpo em liquidação
sou vítima de uma bala perdida do antônio bivar
não sei se sou eu ou ele que não está nem aí
o pior é que atirou desmunhecando
descarregadores de cadáveres
homens, mulheres, crianças, velhos, cães e gatos maltrapilhos
aqui o cheiro das flores podres empesteia o ambiente
bagos no arame farpado arranco
fugindo do haroldo de campos
(Poemas de Marcos Prado e Edson de Vulcanis)
terça-feira, fevereiro 27, 2007
João do Sol
Meus amigos gays depois do pôr-do-sol
Eles sofrem sempre horrores
Eles tremem cedo de medo
Não sabem guardar um segredo
Eles sonham acordados
E choram abafado no escuro
Eles às vezes cortam os pulsos
E riem às vezes a noite inteira
É quando dançam nas pedras
E atiram beijos pra lua
Não fingem então os sempre farsantes
As cores com que se maquiam
abaixa
é natasha
ela morre
agorinha
na minha tv
com alvos no peito
estão tão prontas no prompt
já mortas de medo
mas ainda querem morrer
ao vivo na minha tv
tanta
nuca.
o enterro
o morto
foi lindo
foi rindo
eu berro
e bebo.
Locações para filmar o vento
um palito de fósforo riscado
na calçada
ao meio fio
o palito mascado
jogado no chão
é tarde
misturando os restos da cidade.
E não tem pedras
Garantias-me antes da travessia.
Mentias
E a água estava fria.
mente jamais!
(mas pode mesmo a verdade
toda
caber dentro dos nossos jornais?)
erra jamais
(vem todo o acerto do mundo
impresso em preto
nos nossos jornais).
não trazem a cotação
da bolsa de Maputo: eles não mentem.
Só a verdade pode manter o giro dos nossos capitais.
Se procuras mentiras em nossos jornais.
(Poemas de João Otávio Malheiros)
segunda-feira, fevereiro 19, 2007
O samba que é de outros carnavais
Aproveito a deixa para republicar um texto sobre a folia de Momo.
Os Acadêmicos da Sapolândia
De repente o tal do Luís Américo nos dá o X da questão
em quem mexer com a minha nega
já dei colher de chá,
agora chega”.
homens que não vão nem vêm
parece que avante vão
entre doente e o são
mente a cada hora a espia
na meta do meio-dia
andais entre o lobo e o cão”.
“eu já disse a você
que malandro demais
vira bicho”
cabelos de cabra com pós de marfim
pés e puas de riso motivo
cabelos e topes motivos de rir”.
de um ninho, salta, no árdego trabalho
de árvore em árvore e de galho em galho,
com a rapidez duma semicolcheia.”
agita os guizos, e convulsionado
salta, gavroche, salta clown, varado
pelo estertor dessa agonia lenta.”
“mamãe eu quero mamar”,
“alalaô ô ô, mas que calor ô ô”.
“onde moro que me sinto bem”?
Pois somente aqui,
“onde ela mora”, e "a avenida tem fim"
demora essa sonoridade
“eu nunca tive pinta de eunuco
nem de voyeur do teu balacobaco
meu passarinho saiu do teu relógio cuco
você deixou meu coração batendo fraco”.
Pra terminar, uma pergunta: ouvidos novos ouvem ou vêem os sons que vêm e botam ovos?
sábado, fevereiro 17, 2007
Dureza: um abraço pro gaiteiro
Divido com vocês uma maravilha roubada do blog Malocabilly (link ao lado), por obra e graça do grande Sérgio Viralobos. São coisas assim que me sustentam entre as colunas de trevas que evolam do incêndio de Babilônia.
MARRÉ DE SI
mas dinheiro foi-se o tempo
quase que perco tudo
à procura da agulha no palheiro
na fronha de algum travesseiro
o corpo fica mais puro
sem um puto no bolso
quando se falta o tanto
hoje sou mais valioso
que um dicionário de esperanto
se pisar em moeda, eu passo
meu testamento são folhas em branco
só o gaiteiro me espera pro abraço.
quinta-feira, fevereiro 15, 2007
Uma flor do mal do velho Bode
O VINHO DOS AMANTES
é proibido proibir que tenha fim
bebo o vinho mel, divino néctar,
o céu ainda por cima parece concordar
ambos puros artífices das alturas
eu e a taça, vinhetas da paisagem
o vinho volta à uva, eu, à miragem
mecanismos de um turbilhão inteligente
que tudo ouve vê e só delira
em outro entramos agora como um só
ic! epa! ops! rum...rum...ã? ó!
terça-feira, fevereiro 13, 2007
segunda-feira, fevereiro 05, 2007
O sangue e o batuque
no batuque do coração
rimo rindo
rimo porque sim
rimo indo e vindo
quanto mais rimo melhor
rimo sim e daí?
vivo porque rimo
se rimo amanhã saberei
rimo sempre
rimo uma eternidade
rimo porque morri
confesso que rimei
rimo porque em verdade
em verdade eu sei
que mesmo naquele dia
se a rima me faltar
rimarei
tantã
por dentro e entre
pela vida afora
e antes
hora após hora
por exemplo, agora,
eu rimo sempre
às vezes bato fraco
nenhuma razão de orgulho
somente mais uma canção
apenas mais um coração
fazendo barulho
domingo, fevereiro 04, 2007
Cruz e Souza pede passagem
Amigos. Estamos hoje aqui reunidos para ler o Cruz e Souza. Sem mais rodeios, vamos ao poema.
Vida Obscura
Ó ser humilde entre os humildes seres.
Embriagado, tonto dos prazeres,
O mundo para ti foi negro e duro.
A vida presa a trágicos deveres
E chegaste ao saber de altos saberes
Tornando-se mais simples e mais puro.
Magoado, oculto e aterrador, secreto,
Que o coração te apunhalou no mundo.
E o teu suspiro como foi profundo!
sexta-feira, fevereiro 02, 2007
O sorriso da Iara
A Iara Teixeira deu um susto em todos que amam a graça, o charme e o veneno do seu talento luminoso.
Bateu no hospital, quicou na UTI, mas foi aventura passageira: já está voltando para casa, sã e salva. Na foto, à esquerda, o sorriso da artista completa uma das suas obras-primas.
Bom retorno, Iarinha e parabéns para a irmãzinha Dóris Teixeira, foto à direita (arquiteta com alma), por ter cuidado tão bem deste patrimônio.
domingo, janeiro 28, 2007
Yes, nós temos Miran
Osvaldo Miranda, o Miran, é uma lenda viva das artes gráficas curitibanas. Ele, o Solda, o Rettamozzo, o Marchesini, o Rogério Dias, a Iara Teixeira e outros cobrões, trabalhando juntos, trocando figurinhas, botando o bloco na rua, criaram um padrão de excelência e um ambiente criativo que beneficiou muito a rapaziada mais recente. Abaixo, um orgulhoso exemplo, que tenho a soberba de relembrar, de um trabalho que tive o prazer de dividir com o mestre Miran (cuja edição ele, inclusive, viabilizou). Para ler o texto junto com a arte, clique aqui.
quarta-feira, janeiro 24, 2007
Lamentações de um coitadinho subtropical
Passei a acordar às dez porque estou cansado de nove horas. Mas, como encarnado que sou e, portanto, sofredor solidário das vicissitudes da matéria, ainda considero útil um nadinha de formalidade. Ou até, talvez, quem sabe, um dia, já sonhando alto, viajando e querendo demais, alguma gentileza, de vez em quando. Se não for incômodo.
(Roberto Prado)
sábado, janeiro 20, 2007
A vida está pela hora da morte
Primeiro (mais detalhes no blog do Solda), o Mário Celso Petraglia, poderoso chefão do Atlético PR, fica uma arara com um cartum do Tiago Rechia e liga ameaçando encher o artista de chumbo.
(Pausa para um diálogo imaginário:
"- Alô, aqui é o Mário..."
"- Que Mário?"
"- Aquele que te rodeou o fiofó de bala ao sair do armário.")
Mas, sério, dê uma olhada acima e, mesmo sem ser psicanalista, me ajude a entender o que pegou tão pesado e bateu tão fundo a ponto de magoar por dentro o dirigente esportivo. Para quem não sabe: o cara atendendo o celular representa o Petraglia e o sujeito pendurado simboliza o jogador Dagoberto, que sacaneia e é sacaneado publicamente pelo Atlético há uns bons dois anos. Uma relação nitidamente sadomasoquista, que o Tiago Rechia soube definir muito bem.
Segundo, o Thadeu finalmente virou réu confesso e vai publicar um capítulo a cada três dias da saga O dia que matei o Wilson Martins. Começando nesta segunda, dia 22. Para quem não sabe, o Wilson é um importante acadêmico, intelectual e crítico literário (neste quesito cometeu alguns pecados, especialmente em Poesia, área da qual o cara provou não manjar lhufas). Não sei bem que espécie de barbaridade o Thadeu inflingiu ao insígne professor-doutor, sua vítima. Mas não vou perder os capítulos nem morto. Viva!
Terceiro: mesmo que tudo esteja indo de mal a pior, lembre-se sempre que a vida é boa, a turminha é legal, o mundo é bacana e este é um país que vai pra frente. Por isso, recomendo, com grande entusiasmo que, por enquanto, ninguém pregue bala em ninguém. No mínimo, pelo inútil ridículo inerente ao ato, já que a morte, segundo consta, não existe.
domingo, janeiro 07, 2007
Fazendo chouriço com o próprio sangue
gentileza
essa vida é uma uva
mesmo à pé
sem dinheiro, na chuva
ora viva lua estrela flor
samba
maravilha
só me sobra alegria
me maltratam
eu respondo bom dia
ora viva manitu pã ogum alá
krishna
agradeço
esta terra querida
só me enxotam
quando estou de saída
ora viva cor sabor amor
clima
(Roberto Prado e Beto Trindade)
quinta-feira, janeiro 04, 2007
Um poema de mil novecentos e lá vai pedrada
Eis um poema de 1981, que acabou virando bela canção do Sidail, foi cantado pelas madrugadas dos caminhos mais esquisitos, estreitos e escamosos do roçado do bom Deus (como diria o Plínio Marcos), escoou pelos ralos, evaporou, tornou a chover e, sei lá por quais cargas d'água, eu não havia publicado até hoje. Aí vai, antes que vire fumaça.
Era bonito
foi bom
aquele pisar manso
as ruas de granito
ter atirado pedras
na cidade
que a cidade
é pedra
(Roberto Prado)